Para contribuir com essa discussão, a Agência de Notícias da Alece vai publicar, ao longo das próximas semanas, uma série de três reportagens sobre o assunto. Nesta primeira matéria serão apresentados dados e números sobre mamografias e a contribuição do Parlamento por meio de projetos e leis aprovados na Casa;na segunda, serão abordados fatores que favorecem o desenvolvimento do câncer de mama, os números da doença, acesso ao atendimento médico e ao tratamento e relato de uma servidora da Alece que vivenciou o desafio do tratamento do câncer de mama. Já a terceira matéria esclarecerá quais são os direitos assegurados a esse público e os benefícios garantidos sobretudo às pessoas com sequelas.
Ao falar sobre câncer de mama, um ponto chave é a prevenção, que é feita por meio de consultas e exames de rotina, como as mamografias. E nesse aspecto há um dado preocupante: a quantidade de mamografias de rastreamento no Ceará teve uma queda de 44,5% entre os anos de 2016 e 2021. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), o número de exames em mulheres de 50 a 69 anos realizados no Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado foi de 79.838 em 2016 e 44.303 em 2021. Em Fortaleza, segundo a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), foram feitas 34 mil mamografias nessa faixa etária em 2021.
O ano de 2020, quando iniciou a pandemia de Covid-19, foi o mais crítico, com apenas 31.676 exames de rastreamento realizados no Estado, sendo também o ano com o menor registro no Brasil, com 1,1 milhão de mamografias de rastreamento feitas. Entretanto a queda na quantidade de exames já ocorria nos anos anteriores no Ceará: foram 79.770 em 2017, 68.458 em 2018 e 51.473 em 2019.
Atualmente, no Brasil, a recomendação é de que mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos realizem mamografias de rastreamento a cada dois anos, e a Organização Mundial da Saúde (OMS) estipula como ideal uma cobertura de pelo menos 70%. Porém o Ceará ainda está longe de alcançar esse patamar. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há um total de 902.438 mulheres nessa faixa etária no Estado. Se 70% delas fizessem o rastreamento a cada dois anos, deveriam ser 315,8 mil mulheres examinadas anualmente. “O Ceará segue com índices próximos à média nacional, que, infelizmente, é abaixo do recomendado pela OMS”, reconhece a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) em nota.
A situação preocupante em Fortaleza levou o Ministério Público do Estado a reunir, em audiência no último dia 4 de outubro, gestores da Secretaria Municipal de Saúde para tratar do assunto. Na ocasião, a SMS informou que irá realizar uma força-tarefa, nos próximos dois meses, para reduzir em 50% a fila de espera por agendamentos do exame de mamografia bilateral, que hoje está em torno de 27.318 mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos.
Entretanto, em relação ao número de mamógrafos em uso, o Ceará é a quarta unidade da federação com a maior quantidade, com 412 unidades, atrás apenas de São Paulo (1.429), Minas Gerais (672) e Rio de Janeiro (585). Os dados também são do INCA e relativos a maio deste ano.
DIFICULDADES NA PREVENÇÃO
Na avaliação do médico, professor do Departamento de Medicina da UFC e presidente do Grupo de Educação e Estudos Oncológicos (GEEON), Luiz Porto, a pandemia dificultou o acesso à prevenção nesses últimos anos. Porém ele elenca outros fatores que, mesmo antes, já desestimulavam a busca por atendimento preventivo: o desconhecimento da importância da mamografia e o medo da dor do procedimento, de descobrir o câncer e de perder a mama. “O Ceará tem uma cobertura mamográfica de rastreamento muito baixa”, lamenta.
Luiz Porto comenta ainda que o problema não é tanto o número de aparelhos disponíveis, mas sim a baixa quantidade de exames feitos neles. “Enquanto o nosso mamógrafo (do Geeon) faz mil mamografias, esses outros fazem de 200 a 300 (em média)”, afirma.
O médico defende ainda o acolhimento humanizado das mulheres nos serviços de saúde. “Os nossos serviços de saúde são pouco acolhedores, isso é uma coisa que nós vamos ter que melhorar muito. Nós teríamos que ter psicólogos treinando a comunidade”, defendeu. Ele avalia que, apesar da descentralização da oferta de saúde nos últimos anos, ainda há muita dificuldade de acesso ao atendimento adequado no interior do Estado, inclusive com falta de médicos mastologistas.
ONDE BUSCAR ATENDIMENTO
Mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos devem realizar exames preventivos ao câncer de mama pelo menos a cada dois anos ‒ devendo iniciar aos 40 anos caso possuam algum fator de risco, como os genéticos.
A Sesa esclarece que as pacientes devem procurar a atenção básica (posto de saúde) ou uma unidade de saúde da mulher ‒ também é possível buscar por atendimento espontâneo no Instituto de Prevenção do Câncer (IPC). A partir desse primeiro atendimento, há o encaminhamento para a realização dos exames, que podem ser feitos em uma das 22 policlínicas existentes no Ceará ou nos hospitais Geral de Fortaleza (HGF) e Geral César Cals (HGCC) e no IPC.
Já a SMS informa que a Prefeitura de Fortaleza oferta exames de mamografia em 14 estabelecimentos, entre unidades da rede própria ou contratualizadas, que realizam o atendimento por meio da Central de Regulação. Assim, é necessário que primeiro as mulheres busquem um dos 116 postos de saúde de Fortaleza para ter acesso a uma consulta especializada e ao exame de mamografia.
CÂNCER DE MAMA EM PAUTA NA ALECE
Nos últimos dois anos, a Assembleia Legislativa do Ceará pautou discussões e recebeu proposições de autoria dos deputados sobre temas relacionados à prevenção e ao tratamento para mulheres com câncer de mama.
Duas dessas proposições foram apresentadas pelo deputado Guilherme Landim (PDT), por meio de projetos de indicação que tratam especificamente de exames de mamografia. O PI nº 422/21 dispõe sobre o monitoramento da qualidade dos exames de mamografia realizados nas redes pública e privada de saúde do Estado, bem como a ampliação do número de mamógrafos disponibilizados na rede pública de saúde.
O projeto de indicação nº 199/20, também do deputado Guilherme Landim, sugere que seja dada prioridade à realização de exame de mamografia em mulheres que apresentem histórico familiar de câncer de mama ou nódulos, conforme laudo médico.
A criação do Programa Exame de Mamografia Móvel no âmbito do estado do Ceará é tema do projeto de indicação nº 297/21, de autoria do deputado Agenor Neto (MDB). O objetivo é promover o aumento da cobertura mamográfica em todo território do estado do Ceará, realizado por unidade móvel de saúde.
O apoio psicológico às mulheres com câncer de mama foi apresentado no projeto de indicação nº 168/20, de autoria do deputado Fernando Santana (PT), que autoriza o Poder Executivo a oferecer tratamento de terapia em grupo às mulheres com câncer de mama nas unidades da rede pública de saúde do Estado, podendo o Poder Executivo firmar convênios com entidades sem fins lucrativos.
Na Casa, outras propostas também aprovadas podem beneficiar pessoas com câncer de mama. É o caso do projeto de indicação nº 43/19, apresentado pela deputada Aderlânia Noronha (Solidariedade), que sugere que os órgãos e entidades da administração pública do Ceará concedam aos seus servidores e empregados um dia de licença por ano para a realização de exame preventivo de câncer de mama, de útero e de próstata. A proposta foi aprovada no plenário e foi encaminhada para o Governo do Estado para que seja apreciada e, caso aprovada pelo Executivo, volte à Alece como projeto de lei, para ser votado no Parlamento.
EM APRECIAÇÃO
Há ainda propostas que estão em tramitação na Alece, como o projeto de lei nº 123/22, do deputado Antônio Granja (PDT), que recomenda a criação do programa de incentivo à doação de cabelos para pessoas em tratamento de câncer no Ceará.
O deputado Carlos Felipe (PCdoB), em coautoria com a deputada Fernanda Pessoa (União), sugere, por meio do PL nº 212/19, a criação do Estatuto da Pessoa com Câncer no Estado do Ceará.
O projeto de lei nº 31/22, de autoria do deputado Marcos Sobreira (PDT), propõe o pagamento de meia-entrada para pessoas com câncer em espetáculos artístico-culturais e esportivos realizados no Ceará.
E o projeto de indicação nº 457/21, do deputado estadual André Fernandes (PL), propõe a isenção do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços (ICMS) em medicamentos utilizados no tratamento de diversos tipos de câncer ‒ leucemia, linfoma, câncer de mama ou de pulmão, entre outros ‒, além de doenças como anemia, esclerose múltipla e dermatite atópica e equipamentos utilizados em procedimentos cirúrgicos.
Na próxima matéria da série especial trataremos dos direitos e garantiras às pessoas com câncer de mama e como acessá-los.
GE/JM/CG