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Violência nas escolas: ações de prevenção e desconstrução do medo

por Tribuna Regional
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Violência nas escolas: ações de prevenção e desconstrução do medo

Os ataques a escolas ocorridos nos meses de março e abril no Brasil e a extensa disseminação de ameaças e mensagens de medo pelas redes sociais mobilizaram poder público e sociedade na busca de respostas e ações que resguardassem a comunidade escolar e reforçassem as escolas como local de proteção e desenvolvimento.

Os debates, envolvidos pelo luto e pelo pânico, colocam em foco pontos como a segurança física das escolas, a saúde mental de estudantes, professores e famílias, as causas de tais ataques e o papel das redes sociais nos discursos de ódio e violência.

Em diferentes espaços sociais e esferas do poder público, as iniciativas apontam, principalmente, para a necessidade de prevenção diante de uma rede complexa de fatores que impactam a sociedade e, consequentemente, as escolas.

Em audiência na Câmara dos Deputados, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que “o que está acontecendo nas escolas reflete a realidade na nossa sociedade, de estímulo ao ódio, de estímulo à intolerância, de estímulo à violência, de estímulo ao armamento”.

O Governo do Ceará lançou uma cartilha com orientações básicas sobre segurança nas escolas. O Governo Federal criou canais de denúncias e investimentos na prevenção à violência nas escolas.

Na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) deputados e deputadas apresentaram projetos com foco na violência nas escolas e suas variáveis, comentaram os casos durante as sessões plenárias da Casa, comissões técnicas aprovaram audiências públicas e realizaram reuniões técnicas interinstitucionais e o assunto foi pauta de encontro com representantes de órgão federal.

ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

A pluralidade da Casa Legislativa está refletida também nas diversas possibilidades de abordagem dos problemas vivenciados pela sociedade. Projetos em tramitação na Alece têm como foco a atenção à saúde mental da comunidade escolar, objetivando a prevenção de situações que podem levar à violência ou mesmo à evasão, fator de risco para a vida de muitos jovens.

A deputada Gabriella Aguiar (PSD) é autora do projeto de indicação nº 224/2023, que determina que as escolas de ensino básico da rede pública e privada disponibilizem atendimento de psicologia e assistência social para erradicação de situações de discriminação e violência e acompanhamento de vulnerabilidades.

A implantação do Programa de Atenção Psicossocial nas escolas do Ceará, para prevenção, suporte técnico, atividades e projetos de saúde mental, foi proposta pelo deputado Guilherme Sampaio (PT) no projeto nº 271/23.

Apresentado ainda em fevereiro deste ano, antes dos ataques recentes às escolas, o projeto de indicação nº 82/2023 do deputado Alcides Fernandes (PL) propõe que o Governo do Estado disponibilize atendimento psicológico em todas as escolas da rede pública estadual de ensino para acompanhamento dos estudantes.

O parlamentar ressalta a atenção necessária para a situação das violências nas escolas, apontando que o acompanhamento psicológico pode combater ansiedade, depressão, a evasão escolar e contribuir com o desenvolvimento dos estudantes.

Confira áudio do deputado sobre o papel do Legislativo para enfrentar o problema:

SISTEMAS DE SEGURANÇA

Após os ataques, diversos parlamentares apresentaram projetos com foco na segurança dos estabelecimentos de ensino do Estado. As propostas apontam para a instalação de ferramentas como câmeras, detectores de metais e batalhões específicos para as escolas.

Três projetos, sendo um de lei e dois de indicação, propõem comunicação direta das escolas ou da Secretaria de Educação com as forças de segurança do Estado: nº 502/2023, que tem autoria do deputado Júlio César Filho (PT) com coautoria da deputada Gabriella Aguiar (PSD) e do deputado David Durand (Republicanos), nº 228/2023, da deputada Dra. Silvana (PL) e nº 241/2023 do deputado Apóstolo Luiz Henrique (Republicanos), que cria o “Disk Escola Segura”.

A instalação de câmeras de monitoramento nas escolas e em seus entornos é proposta no projeto nº 261/2023, do deputado Carmelo Neto (PL). O de nº 263/2023, do deputado Cláudio Pinho (PDT), torna obrigatória a instalação de porta/portão eletrônico com detector de metal nas universidades públicas do Ceará.

O deputado Alcides Fernandes apresentou a proposição nº 231/2023 que propõe a criação do Batalhão de Policiamento Escolar dentro da estrutura da Polícia Militar do Estado do Ceará. O projeto nº 277/23, do deputado Romeu Aldigueri (PDT), cria no Estado a Guarda Escolar Estadual (GEE) e normas de prevenção e segurança nas escolas públicas estaduais.

Do deputado Leonardo Pinheiro (PP), o nº 240/2023 propõe o Programa de Segurança nas Escolas do Estado do Ceará que aborda questões como portarias com detectores de metais, equipe treinada para acompanhar a entrada e saída de pessoas nas escolas, instalação de câmeras, entre outras.

Os projetos de indicação são sugestões dos parlamentares para ações, podendo ser efetivadas ou não pelos órgãos competentes, nesses casos, o Poder Executivo.

ATUAÇÃO INTERINSTITUCIONAL

A Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alece realizou na última terça-feira (18/04), reunião técnica interinstitucional para debater procedimentos em casos de violência nas escolas. O presidente do Colegiado, deputado Renato Roseno (Psol), comentou durante o encontro que muitas vozes na arena pública têm apontado para uma perspectiva armamentista e de vigilância para enfrentar o problema, mas é preciso mostrar que o Ceará tem tecnologia social para mediar a questão.

Ele elencou sugestões encaminhadas ao Governo do Estado, como, por exemplo, a implementação da Lei federal 13.935, sobre equipes de psicologia e serviço social nas escolas, maior atenção para a saúde mental, especialmente da população infanto-juvenil, formação para o uso responsável das redes sociais, elaboração de um procedimento operacional padrão para violências nas escolas e implantação de medidas básicas de segurança escolar, como controle de acesso.

Também foi ressaltada a necessidade de fortalecimento e ampliação de iniciativas já existentes, como o projeto “PREVINE – Violência nas Escolas, não!” do Ministério Público do Estado do Ceará, a instalação das Comissões Escolares de Prevenção à Violência nas redes municipais e o fortalecimento da Divisão de Proteção ao Estudante (Dipre) da Polícia Civil e do Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades (Copac) da Polícia Militar.

Confira áudio do deputado sobre ações de enfrentamento à violência nas escolas:

ATENÇÃO ÀS REDES SOCIAIS

As dinâmicas sociais mudam com especial rapidez quando se fala na comunicação e na forma como as redes sociais impactam as relações e disseminação de informação. Em situações de crise, como os ataques violentos às escolas, mentiras e mensagens deturpadas com a intenção de provocar medo se espalham e amplificam o problema.

Durante reunião técnica da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alece, o titular da Divisão de Proteção ao Estudante (Dipre) da Polícia Civil, inspetor Cláudio Marques, reiterou a necessidade de atenção ao uso responsável das redes sociais na comunidade escolar.

Ele comentou que na maioria dos casos em que a Divisão é acionada a questão está relacionada a fake news, discurso de ódio e outros usos irresponsáveis das redes, situações que podem sair rapidamente do controle. Dessa forma, há a necessidade de sensibilização para identificar o problema, compreender o nível de risco e tentar solucionar a partir de uma abordagem especializada para o ambiente escolar.

O pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Rede de Observatórios de Segurança, Ricardo Moura avalia como as redes sociais atuam na questão da desinformação e constituem espaços de disseminação do pânico. Ouça o áudio do pesquisador:

O cenário de pânico e a responsabilidade com as informações fizeram com que parte da imprensa brasileira passasse a alterar alguns procedimentos nas últimas semanas, como a não publicação dos nomes dos acusados, assim como fotos ou vídeos dos ataques, assim como o cuidado com a publicação de detalhes ou informações do planejamento das ações criminosas.

As estratégias são defendidas como forma de não dar notoriedade aos acusados e não estimular novos casos. A divulgação dos meios de denúncia, das ações do poder público para prevenção e o combate ao pânico são apontados como ferramentas mais responsáveis socialmente por parte dos meios de comunicação.

Ricardo Moura avalia ainda que as propostas focadas somente nas ações de segurança não são inócuas, por aumentarem a sensação de segurança da comunidade escolar, entretanto elas não chegam perto da resolução da questão.

Segundo ele, a literatura mundial sobre o assunto aponta que essas medidas são insuficientes para o tamanho do desafio. Para o pesquisador, é importante tentar estabelecer canais de diálogo com adolescentes e crianças, como um trabalho a médio e longo prazo. Ele avalia que a integração das novas gerações precisa ser abordada, pois muitas vezes elas não se sentem reconhecidas e buscam a violência como uma forma de se afirmar.

PREVENÇÃO TRANSVERSAL

Na avaliação do Comitê de Prevenção e Combate à Violência da Alece, a violência na escola é também reflexo de uma sociedade violenta. E a escola precisa ser valorizada como espaço de proteção, respeito e promoção de paz.

Com trabalho iniciado em 2016, o Comitê realizou diversas pesquisas e possui uma série de recomendações com foco na prevenção dos homicídios na adolescência. Entre elas, algumas na área da educação, como a busca ativa para inclusão de crianças e adolescentes na escola, ações de apoio, informação e orientação familiar nas escolas e a produção de material para autoproteção e uso seguro da internet.

O coordenador do Comitê, Thiago de Holanda, explica que foi possível acompanhar ao longo dos anos um aprofundamento da violência comunitária, da violência armada que começou a chegar às escolas.

No vídeo a seguir, ele comenta algumas ações do Comitê relacionadas à prevenção da violência nas escolas, como o apoio às Comissões Escolares de Prevenção à Violência, previstas na Lei Estadual 17.253.

A violência de forma geral e as formas de violência que chegam às escolas, espaços tão importantes para a sociedade, demandam atenção integrada, diálogo aberto envolvendo toda a comunidade e o poder público, acolhimento e escuta daqueles impactados pelas tragédias dos ataques e pelas crises contínuas que afetam o ambiente escolar.

Durante reunião técnica realizada na Alece, o Major Messias Mendes, titular do Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades da Polícia Militar, comentou a necessidade de uma abordagem qualificada e racionalizada do poder público, reiterando que “as instituições, neste momento, precisam mostrar o valor social e a prova material do porque elas existem, elas existem para criar referenciais de conduta”.

O comandante destacou a importância da desconstrução do medo. “A escola não se transformou em um ambiente tão inseguro como se tem pregado, a escola continua a ser uma escola de tranquilidade, de segurança e de proteção”, afirmou.

O reforço das escolas como ambientes de proteção em parceria com as famílias e sociedade em geral e o papel do poder público para agir na prevenção e garantia dos direitos da população a partir de ações integradas e responsáveis são alguns dos caminhos que devem seguir em debate aberto e contínuo na sociedade.

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